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13.7.16

Falando sobre luto - Festa no Céu


Por Tania Miranda


De uma forma ou de outra todos nós já vivenciamos o processo de luto, seja  com a morte de alguém querido, ou acompanhando a perda de um amigo ou mesmo um paciente. E tão difícil quanto viver ou acompanhar o luto , é falar sobre ele.

Com o crescimento dos meus filhos me aproximei das questões que as crianças tem com a morte e me questionei quanto à melhor maneira de abordar o tema. Mas outro dia, assisti com os pequenos a animação  " Festa no Céu" ( o titulo original é The Book of Life ) e tivemos uma ótima oportunidade de conversar sobre esse assunto, o que me fez refletir sobre uma nova possibilidade de pensar o tema com adultos e crianças.

Festa no Céu narra  a mais importante história do "Livro da Vida", que é baseada nas tradições mexicanas e envolve três mundos, a Terra dos Vivos, a Terra dos Lembrados e a Terra dos Esquecidos. A Terra dos Lembrados é governada pela deusa ancestral Catrina, La Muerte, e é  um lugar alegre, onde ficam todos os mortos que são lembrados e amados por suas famílias. A Terra dos Esquecidos é um lugar triste onde ficam os mortos que não são mais lembrados na Terra dos Vivos, ela é governada por Xibalba,  que é ex-marido de Catrina e um grande trapaceiro. O filme se desenrola contando sobre uma aposta feita por La Muerte e Xibalba que vale o domínio da Terra dos Lembrados.


Em meio a muitas cores, figurinos exuberantes e um triangulo amoroso, o filme mostra a tradição mexicana do Dia dos Mortos, que muito diferente da tradição brasileira, é dia de festa, pois segundo a tradição popular, os mortos tem permissão para visitar o Mundo dos Vivos e sendo assim, são esperados com música, dança, fantasias, enfeites e muita comida.  



É claro que o filme traz uma crença popular mexicana, diferente das nossas em muitos aspectos, mas a ideia de que o reino dos mortos  pode ser alegre e festivo,  e que enquanto a pessoa for lembrada no reino dos vivos, ela estará na Terra dos Lembrados junto a todos os outros mortos da família, me parece muito reconfortante e na verdade, muito saudável.

De maneira geral os autores que tratam sobre o tema, dividem o luto em quatro fases, sendo choque, negação, depressão e aceitação. É claro, que viver cada fase do luto é esperado e natural, mas percebo que a ideia que o filme nos traz  é uma ideia que pode nos aproximar da aceitação, onde podemos e devemos lembrar de nossos mortos e isso fará bem a todos.

Mesmo depois de passarmos pelas fases do luto, sentir saudades, lembrar e até mesmo chorar pelas pessoas queridas que perdemos, faz parte de nossas vidas. Lembrando podemos trazer para nossa realidade todo o significado daquela pessoa e assim elaborar essa perda. Aceitamos nossas perdas, mas não nos esquecemos delas, não precisamos esquecer.  

Achei muito interessante pensar nessa perspectiva, e entendo que o filme "Festa no Céu" seja uma boa maneira de iniciar os difíceis diálogos sobre o tema, seja com as crianças, nos processos terapêuticos ou com nós mesmos.  

Ah, as ilustrações são da minha Lili...





                                                                                 




12.7.16

Como nossos pais ???


Por Tania Mendonça

O relacionamento entre pais e filhos se modifica no decorrer da vida de ambos os lados, tendo também diferenças a partir da cultura que a família está inserida e pela religião que acreditam. Claro que as diferenças individuais devem ser considerada nesse relacionamento e como o pai e mãe vivenciaram a própria infância e o papel de filho ou filha.
Pensando de maneira utópica os pais deveriam ter o papel de protetores e cuidadores, zelando pelos bem estar integral da criança, isso significa que não basta fornecer uma casa, comida e roupas (itens que alguns pais não oferecem), é necessário cuidar de maneira amorosa, fornecer uma boa escola, acompanhar o desenvolvimento para evitar surpresas desagradáveis com más companhias e estar disposto a responder perguntas sobre muitos assuntos!
Não podemos esquecer que educação financeira, religiosa e sexual devem estar presentes. A sensação que tenho escrevendo sobre isso como mãe é de estar cumprindo uma lista de afazeres e como filha é pensar que não dei tanto trabalho assim. Será? Hoje como mãe tenho absoluta certeza (tenha essa certeza sobre poucas coisas) que educamos muito mais pelo exemplo do que pelas palavras.
A criança é capaz de perceber quando você fala algo que não faz, ainda mais se pedir pra ela fazer, o pai ou mãe diz: "coma brócolis porque é uma delícia" e no prato dos pais não tem nenhum legume. Não bata no seu irmão! O pai diz isso dando um tapa na criança. Educar é uma tarefa árdua e interminável, educar solicita empenho, esforço e muita paciência.
Como mãe posso afirmar que educar demanda renûncia, paciência, muito amor e dedicação, não esquecendo que é saudável educarmos com limites e regras desde pequenos, pois as crianças precisam de parâmetros para se guiar, quando não existem regras claras e limites as crianças sentem-se perdidas e sem orientação. Provavelmente vão dar mais trabalho.
Respeitar os próprios limites como mãe também é bastante saudável, afinal enfrentar a tarefa exaustiva de educar e cuidar sem reconhecer que somos humanos não trará benefícios pra ninguém, pois a sanidade mental e física da mãe ficará comprometida e como poderá se doar se não está bem?
Vale ressaltar que esses princípios podem orientar os pais, porém não é possível esquecer que a principal atividade de uma criança deve ser brincar e aprender a partir das experiências vividas, brincar significa experimentar, testar hipóteses e criar. Descobrir a grande novidade que é o mundo e seus infinitos detalhes. Conforme a criança vai crescendo, os pais aos poucos devem permitir que a criança se distancie deles e desenvolva a sua autonomia.
A criança tem os pais ou cuidadores como exemplo, em geral existe grande admiração por eles. Como professora aprendi que só podemos prometer a uma criança quando podemos cumprir, se você promete algo que deixa de ser possível cumprir, uma explicação é o ideal. Quando a promessa não é cumprida ou os pais mentem, a confiança da criança diminui, muitas vezes até acabar, sendo uma decepção grande para a criança e modifica a relação, podendo prejudica-la.
Como psicóloga acredito que as crianças necessitam de cuidados amorosos para conseguir se desenvolver e explorar o mundo com segurança, os limites e regras são essenciais, pois as crianças necessitam de parâmetros para se organizarem e sentirem-se tranquilas. Quando uma criança inicia na escola experimenta a angustia de esperar pelos pais, em geral quanto menor a criança, a adaptação é mais fácil, quando a professora descreve a rotina e fala que depois de determinadas atividades ela irá embora, é possivel ficar mais calma. 
Um livro muito divertido e interessante que descreve como é a educação na França, no ponto de vista de uma jornalista americana, onde a educação acontece de outra maneira. A questão do limite é também comentada de uma forma que apreciei bastante. O livro é   "Crianças Francesas não fazem manha" Pamela Druckerman.
Assim os filhos vão crescendo, se tornam adultos e começam a perceber o quanto são parecidos com os pais, o quando deles estão presentes na fisionomia, no jeito e gestos e até mesmo nas crenças e valores. Provavelmente os filhos terão filhos e quando estão criando-os terão uma oportunidade impar que a vida dá, que é trocar de papel com os pais que cuidaram dos filhos e cuidar deles na velhice.
Quando escrevi esse texto me lembrei dessa música, creio que seja possível refletir sobre a relação entre pais e filhos, vale a pena ouvi-la.





Como nossos pais
Elis Regina



Não quero lhe falar meu grande amor 
De coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi 
E tudo o que aconteceu comigo 
Viver é melhor que sonhar 
E eu sei que o amor é uma coisa boa 
Mas também sei 
Que qualquer canto é menor do que a vida 
De qualquer pessoa

Por isso cuidado meu bem 
Há perigo na esquina 
Eles venceram e o sinal 
Está fechado pra nós 
Que somos jovens...

Para abraçar seu irmão 
E beijar sua menina, na rua 
É que se fez o seu braço, 
O seu lábio e a sua voz...

Você me pergunta pela minha paixão 
Digo que estou encantada como uma nova invenção 
Eu vou ficar nesta cidade não vou voltar pro sertão 
Pois vejo vir vindo no vento cheiro de nova estação 
Eu sinto tudo na ferida viva do meu coração...

Já faz tempo eu vi você na rua 
Cabelo ao vento, gente jovem reunida 
Na parede da memória esta lembrança 
É o quadro que dói mais...

Minha dor é perceber 
Que apesar de termos feito tudo o que fizemos 
Ainda somos os mesmos e vivemos 
Ainda somos os mesmos e vivemos 
Como os nossos pais...

Nossos ídolos ainda são os mesmos 
E as aparências não enganam não 
Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém 
Você pode até dizer que eu tô por fora 
Ou então que eu tô inventando...

Mas é você que ama o passado e que não vê 
É você que ama o passado e que não vê 
Que o novo sempre vem...

Hoje eu sei que quem me deu a ideia
De uma nova consciência e juventude 
Tá em casa, guardado por Deus 
Contando vil metal...

Minha dor é perceber que apesar de termos 
Feito tudo, tudo, tudo, tudo o que fizemos 
Nós ainda somos os mesmos e vivemos 
Ainda somos os mesmos e vivemos 
Ainda somos os mesmos e vivemos 
Como os nossos pais...

11.7.16

Isso é do seu tempo ????


Por Tania Mendonça

     Outro dia meu marido que tem 45 anos foi questionado por nossa filha de 6 anos, com a seguinte pergunta : Pai, como era no seu tempo ? A pergunta ficou incomodando os meus pensamentos, como assim "era" no seu tempo ? Fiquei pensando que a vivência do nosso tempo é sempre agora ! Nós estamos vivendo e vendo acontecer nosso tempo no momento presente, esse termo é usado em algum comentário que a própria pessoa ou outra comenta que no nosso tempo era assim se referindo ao passado. Ah! No meu tempo não existia nem celular e computador, não existia mesmo!
   A vivência do tempo é muito particular, podemos estar em 2016 compartilhando o mesmo calendário, porém o tempo interno de cada um pode estar voltado para o presente, para o passado ou para o futuro. Quem nunca viveu uma decepção amorosa e ficou mergulhada nas lembranças do passado com um vislumbre triste e sem esperança sobre o futuro? Podemos observar também quando o futuro é aguardado com muito entusiasmo e alegria na gravidez quando esperamos o nascimento de um filho.
     Já dizia Albert Einstein que o tempo é relativo, na verdade o tempo cronológico é o mesmo para todos, mas a nossa percepção sobre o tempo muda conforme vivenciamos a sua passagem. Quando estamos cuidando de um recém nascido, cada dia com a rotina intensa pode parecer que dura muito mais. Pra mim os três primeiros meses da minha filha mais velha, com muitas cólicas e muito choro, demorou um ano para passar. Quando estamos numa festa ou num momento divertido, 4 ou 5 horas se passam rapidamente.
   Atualmente, na nossa sociedade a velocidade com que a informação transita possibilita que possamos conhecer informações atuais, relembrar músicas e personagens da nossa infância. Quando eu era criança, há uns 30 e poucos anos, era impossível encontrar uma música ou filme que gostássemos. Hoje podemos encontrar tudo numa velocidade incrível, podemos encontrar coisas do "nosso tempo", assim vamos envelhecer, porém poderemos reviver o "nosso tempo" sempre agora.
  Depois de escrever esse texto esbarrei nessa maravilhosa poesia.


Mudança de Idade - Mia Couto
Folha de São Paulo - 03/07/16

Para explicar
os excessos do meu irmão
a minha mãe dizia:
está na mudança de idade.
Na altura,
eu não tinha idade nenhuma
e o tempo era todo meu.
Despontavam borbulhas
no rosto do meu irmão,
eu morria de inveja
enquanto me perguntava:
em que idade a idade muda?
Que vida,
escondida de mim, vivia ele?
Em que adiantada estação
o tempo lhe vinha comer à mão?
Na espera de recompensa,
eu à lua pedia uma outra idade.
Respondiam-me batuques
mas vinham de longe,
de onde já não chega o luar.
Antes de dormirmos
a mãe vinha esticar os lençóis
que era um modo
de beijar o nosso sono.
Meu anjo, não durmas triste, pedia.
E eu não sabia
se era comigo que ela falava.
A tristeza, dizia,
é uma doença envergonhada.
Não aprendas a gostar dessa doença.
As suas palavras
soavam mais longe
que os tambores nocturnos.
O que invejas, falava a mãe, não é a idade.
É a vida
para além do sonho.
Idades mudaram-me,
calaram-se tambores,
na lua se anichou a materna voz.
E eu já nada reclamo.
Agora sei:
apenas o amor nos rouba o tempo.
E ainda hoje
estico os lençóis
antes de adormecer.


No livro “Tradutor de chuvas”

Autor : Mia Couto

24.6.16

A Verdade Vestida de Fábula



Por Tania Mendonça


     Quando pensamos na importância das histórias, nossas ideias podem ir até os homens das pré históricos que registravam a sua vida nas paredes das cavernas e transmitiam aos outros. Atualmente as mesmas continuam fazendo parte do nosso cotidiano, sejam através dos livros, gibis, filmes, cinema e fábulas.
   Experimentamos um mundo novo e desconhecido entrando em contato com elas, nos emocionamos, sofremos e sorrimos. Qual mãe e pai nunca assistiu alguma dezena de vezes o filme preferido dos filhos, como Frozen, Rei Leão ou qualquer filme sobre princesas???
       Já que estamos falando sobre histórias, segue uma muito pertinente a nossa conversa e reflexão : A verdade vestida de fábula.
     "Quando Deus criou a mulher criou a fantasia, sendo assim a Verdade desejou conhecer um palácio, ela se apresentou ao guarda como a Verdade e vestindo apenas um véu transparente, o mesmo foi consultar o Sultão que ficou alarmado com a presença da verdade e o que poderia causar no seu reino. Porém com a criação da mulher Deus criou a teimosia, assim a Acusação vestiu-se de peles grosseiras somente deixando o rosto de fora e exigiu falar com o Sultão, que ficou amedrontado em receber tal visita. Mais uma vez ela foi embora. Ressaltando que quando Deus fez a mulher criou também o capricho, desta forma a mulher procurou as roupas mais lindas, com brilhos e as cores do arco-iris, enfeito-se com joias e se perfumou, voltou ao palácio e se apresentou como a Fábula, o serviçal ficou encantado com com a visitante, apresentou ao Sutão como a Fábula, ele prontamente deixou ela entrar, sendo recebida com festa, presentes, flores, danças e músicas. Foi assim que a Verdade vestida de Fábula conheceu o fantástico palácio."
       Como pais muitas vezes buscamos orientação, conselhos e opiniões sobre a árdua tarefa de educar filhos. Como o Sultão se refletirmos sobre esse texto podemos pensar que o ideal não seria receber esses conselhos de forma muito direta, explicita e contundente como a Verdade com o seu véu transparente, nem tão pouco receber essas opiniões de forma grosseira e em tom de Acusação, sem respeitar a forma como percebemos o mundo.
         Nesse sentido o mundo mágico das Fábulas pode nos ser valioso quando buscamos um ponto de partida para nos auxiliar a pensar a forma como conduzimos a educação dos filhos por exemplo e até nossa própria vida.
        Nosso objetivo é esse, refletir com vocês sobre questões importantes e até mesmo divertidas do mundo mítico, de uma maneira gostosa de um bate papo, afinal somos também mães, esposas, irmas, amigas e como dizem, as psicólogas vêem o mundo de maneira muito peculiar. Então, vamos lá!!!