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5.5.17

Mergulho Necessário



Por Tania Correia Mendonça

As doenças mentais se configuram como um assunto muito dificil de ser abordado e vivenciado, é indiscutível que o paciente psiquiatrico sofre absurdamente, nem de longe podendo ser plenamente compreendido pelos familiares e amigos.
Existem inúmeros preconceitos e significacões relacionadas ao assunto que possibilitam comportamentos de mais diversos tipos, na minha formação como psicóloga, em um estágio conheci uma senhora que tinha um delírio em que ela falava e ela mesmo respondia:
  • Dr. Leocádio ?
  • Sim, minha noiva.
  • Dr. Leocádio ?
  • Você está aqui ?
  • Sim, minha noiva.
Esse diálogo-monólogo se estendia pelo dia todo, intrigada perguntei aos enfermeiros, eles me contaram que ela era apaixonada e noiva de um rapaz, mas por proibição dos pais dela, eles não se casaram, o rapaz era pobre e ela muito rica. Ela não se casou com ninguém e na velhice essa vivência era retomada no delírio, o interessante é que ela fazia duas vozes, a dela e a dele.
Para a Fenomelogia, a doença mental tem um significado particular para cada pessoa, por mais que os sintomas sejam os mesmo podendo ser reconhecido pelo psiquiatra.
A visão da Fenomelogia me tras a reflexão que as pessoas podem ter a mesma doença psiquiátrica mas, cada um adoece pelos seus motivos relacionados a sua história de vida, dentre outras razões. O adoecimento não surge do dia para a noite, dando sinais muitas vezes ignorados pela pessoa, mostrando que algo não está indo bem.
Muitas vezes a significação pode ser descoberta com a terapia, com o processo colaborativo entre paciente e psicólogo. É essencial uma atitude de acolhimento e compreensão, permitindo confiança e lançando luz sobre a própria vida, permitindo se aproximar e cuidar do que tem necessidade.
É dificil falar em cura, já pensando no próprio significado da palavra cura, porém podemos vislumbrar melhoras significativas com a combinação de remédios e terapia.
Mesmo não sendo psiquiatra posso comentar que existe um debate sobre a origem das doenças mentais, alguns acreditam que a origem é biológica, fisíca ou neuronal, outros acreditam que é vivencial, ligada a história de vida e ao comportamento da pessoa. Hoje temos um consenso que o tratamento é com medicamentos e terapia.
Existem algumas doenças mentais que com o uso do remédio já melhoram muito, outras que só com a combinação entre remédios e terapia se tem sucesso. Como não sou psiquiatra não quero e não tenho condições de discorrer sobre essas especificidades.
Vou abordar algumas visões preconceituosas que já ouvi no decorrer da minha experiência como pessoa e como psicóloga :
  • Que absurdo, você vai amarrar e dar remédios para uma pessoa que está saindo pelada na rua??? Você é muito desnaturado!!!
    Qual seria a opção ? Deixar a pessoa sair correndo e sumir ou deixar ela se machucar, se matar ou matar alguém? Em algumas situações é necessário que o paciente seja internado, contido e medicado, em muitas doenças psiquiátricas a atitude do paciente é perigosa paraa sua vida ou de outras pessoas.
  • Como você está com depressão sendo que tem tudo ! Que tem uma ótima vida.
    A depressão é uma condição clinica que não está associada aos bens materias diretamente, pode até ter em alguns casos em que tenha relação e significado na história de vida do paciente. A depressão é a perda do sentido pessoal da vida, é um entristecimento absurdo, as atividades que eram prazeirosas passam a ser insípidas. Se pensarmos no exemplo até o tudo que se tenha não tem graça nenhuma. Um mergulho dentro de si mesmo se faz urgente e muito salutar, a terapia pode ajudar na busca de sentido e os remédios na estabilização do paciente para conseguir ter energia e começar a se cuidar.
  • Ele não está louco, pois no momento do surto da loucura estava se divertindo!
    É compreensível que a pessoa pense assim, pórem será que uma pessoa que estava rindo ao ficar pelada na rua, ao pessear pelada na frente da tia de 85 anos e tentou enforcar o primo e não falar nada com nada está feliz???
    A loucura é muito solitária, ninguém compartilha a vivência do louco com ele e isso é muito triste, estar em um mundo de significados completamente sozinho. Como pode estar rindo ? Está rindo porque perdeu a censura, está rindo por que perdeu a razão, está rindo porque vive o que ninguém pode compartilhar, rí porque esta livre e a deriva. A seguir falarei mais da censura.
  • A pessoa não está louca, isso foi contra mim de propósito, falou cada coisa!!!
    Em geral, quando a pessoa está vivenciado um surto não vai escolher com quem ou em que situação vai surtar, podem existir pessoas ou situações que potencializam o surto. Com relação a censura é interessante observar que as pessoas pensem antes de falar ou não falem tudo que pensam para todos, porém no surto a fala sem filtro é muito comum, dizer exatamente o que pensa sem lapidar e sem censura.
    Você iria a um casamento e ao ver a noiva com uma maquiagem feia e carregada, com 9 meses de gestação com um vestido justo e curto, você diaria que ela está ridícula ou desejaria felicidades agradecendo o convite?
  • Ela não está doente !!! Ela está fingindo, conversei com a minha amiga x que é formada na faculdade z e ela deu certeza que a pessoa não tem nada.
    É muito comum ouvir declarações desse tipo, são absurdas! A minha primeira pergunta seria : quando foi que a sua amiga examinou a pessoa doente? Quais informações ela tinha pra fazer o diagnóstico? Ah, a pessoa não conhece a pessoa adoecida? E como ela fez o diagnóstico? É muito comum ver leigos dando informações categóricas e prejudiciais.
    Quando se tratam de doenças mentais é bom ficarmos atentos a mudanças em que a pessoa se comporta de maneira dieferente ao que fazia, é importate o ponto de referência para a comparação seja ela mesma. É essencial encontrar um psiquiatra competente e humano, que se aproxime do paciente e não só da doença, que auxilie no processo de busca de respostas, conversando, perguntando e interagindo.
    A terapia é um espaço de cuidado, de acolhimento e busca, é possivel tentar compreender como significamos a nossa vida e como entramos na inflexibilidade de uma depressão ou como começamos a adoecer, vivenciando enorme sofrimento. Com esse processo a busca da cura se torna secundária, uma vez que a importância está no caminho da descoberta, quando lançamos luz sobre o que parece inacessível.



1.3.17

Sofro para não desagradar ...



Por Tania Mendonça e Tania Miranda

As relações humanas estão presentes em todos os ambientes da nossa vida, nos relacionamos com pessoas que tem diferentes tipos de comportamentos e atitudes. Encontramos pessoas tidas como calmas e sensatas, já outras são consideradas explosivas e intolerantes, claro que entre esses dois extremados tipos existem várias possibilidades e maneiras de agir no mundo.
Nossa vida é um celeiro fantástico de reflexões e observações que temos a disposição pelo simples fato de estarmos vivos, também podemos contar com um recurso espetacular que é a terapia. A busca pelo autoconhecimento não é simples clichê, é uma oportunidade real de crescimento, de transformação e de diminuição do sofrimento tão próximo da nossa existência.

Nossa reflexão passa justamente pelo sofrimento humano, há alguns dias uma pessoa que tem posição profissional de destaque nos contou que estava triste e deprimida por ir trabalhar, estranhamos, pois ela ama seu ofício, o motivo da tristeza era uma funcionária desagradável, que não obedecia as suas orientações.
O espanto foi enorme, já que essa funcionária poderia ser demitida por ela, quando questionada sobre o motivo de não demitir ou falar alguma coisa, a resposta foi que não queria entrar em conflito ou desagradar. Essa pessoa é conhecida como calma, gentil, sensata e tranquila, porém estava deprimida para evitar um conflito.
Socialmente é mais valorizado o indivíduo que resolve os seus problemas e conflitos conversando, sem gritar ou explodir e as pessoas que gritam e se expressam explosivamente não são vista com bons olhos, o objetivo aqui não é refletir como a sociedade vê a repercussão de nossas ações, mas é pensar o que influencia a pessoa a adoecer ao invés de expor o que sente.
Não é novidade que o corpo manifesta o que sentimos, quando não é possível lidar e refletir sobre nossos sentimentos. Segundo Ramos (1994), a doença surge a partir desse desequilíbrio entre o consciente e o inconsciente, quando não conseguimos transformar as emoções que vivenciamos em nosso cotidiano em representações psíquicas (ideias, lembranças, pensamentos, desejos), passamos à expressa-las no corpo. Como exemplo disso podemos citar a Depressão e doenças autoimunes (onde os anticorpos, responsáveis pela defesa do corpo, atacam o próprio corpo) como o Lúpus e a Artrite Reumatoide.
É claro que ninguém escolhe racionalmente sofrer ou adoecer, porém nem todas as escolhas acontecem de maneira racional e consciente. Jung (1991) nos diz que em nosso inconsciente existem todas as possibilidades, mas muitas vezes ficamos presos às mesmas atitudes e pensamentos, sem conseguir elaborar e gerar novas ideias e ações.
Na nossa formação como pessoa nós passamos por influências familiares, sociais, culturais, religiosas e do convívio com os amigos que moldam a forma como encaramos e vida e as crenças que temos. Para algumas culturas as mulheres andam cobertas, em nossa cultura podemos usar biquínis e frequentar a praia, a questão não é julgar quem está certo ou errado, mas compreender como cada pessoa entende e lida com essa construção social e o quanto pode sofrer ou ter prazer por ter que cumprir os papéis sociais.
Na visão da psicologia analítica, essa adaptação social é feita através da persona, ou seja, das máscaras que utilizamos para nos adaptar a cada situação social. Mas nós não somos apenas máscaras, somos muito mais, porém por vezes agimos como se fossemos, deixando para trás nossa verdadeira essência, presos ao medo de não sermos aceitos, amamos e respeitados por todos em todos os momentos.
Voltando a nosso exemplo, podemos perguntar:

Porque a pessoa não encontra recursos para enfrentar a situação, expor a sua opinião e mudar uma configuração que não a agrada? Porque essa pessoa adoece de depressão para não se indispor ou vivenciar um conflito? Porque deixar a já conhecida persona de pessoa calma e equilibrada e tão difícil? Quais os ganhos? Quais os medos?
Um processo terapêutico cuidadoso pode compreender as motivações e buscar recursos para transformar o sofrimento emocional, buscando ampliar a visão de mundo, questionar as exigências sociais enfrentadas e repensar sobre o trivial, pois são nos detalhes repetitivos da nossa existência que estão as respostas que tanto buscamos.
Um bom psicólogo fará perguntas que permitam olhar o conhecido como novo, é um trabalho conjunto e colaborativo de montar um quebra cabeça. A pessoa que contamos encontrou uma saída para o conflito, mudou de emprego e recuperou o prazer e a felicidade em trabalhar, porém outros conflitos e desafios virão, como a pessoa calma e sentada poderá resolver sem fazer sofrer a si mesma?

Bibliografia
RAMOS, D. G. A. A psique do corpo. São Paulo: Summus, 1994.
JUNG, C.G. Tipos psicológicos. O. C. v. 6. Rio de Janeiro: Vozes, 1991.




10.8.16

Você é Introvertido ou Extrovertido?




Por Tania Miranda


Os conceitos de introversão e extroversão são certamente uns dos mais conhecidos da obra de Jung.  É muito comum falarmos que alguém é extrovertido, por ser alegre e falastrão, ou que outro é introvertido por ser bastante tímido e fechado.

Mas será isso mesmo? Sabemos o que é ser extrovertido ou introvertido?

A introversão ou a extroversão dizem respeito a atitude da consciência do indivíduo, se sua energia psíquica será direcionada para o interior ou exterior, para o sujeito (ele próprio) ou para o objeto (outras pessoas ou estímulos). Entendemos por energia psíquica, a energia que movimenta toda a psique, e engloba todos os aspectos de nossas vidas ( fome, sexo, emoções,etc.). Ela se mostra através de nossos esforços, desejos e vontades. 

Dessa forma, o introvertido é aquele que recua diante do objeto, que sente-se mais confortável se está em contato com seus pensamentos e sentimentos. Na prática, é aquele amigo que prefere pequenas festas, com amigos íntimos, mas que não são necessariamente tímidos, apenas preferem atividades mais solitárias.

Já o extrovertido é aquele que vai ao encontro do objeto, que adora se envolver com as pessoas e coisas do mundo externo. É o amigo que sempre é o último a sair, que não pode perder a chance de estar no mundo. 



Os filmes e contos de fadas também nos dão exemplos de personagens introvertidos e extrovertidos, como Elsa e Ana, do filme Frozen da Disney ou Branca de Neve e Rosa Vermelha, dos Irmãos Grimm.  

Nos dois casos as irmãs representam os opostos, sendo Ana muito alegre, divertida, sempre buscando relaciona-se com alguém, já Elsa, evita os relacionamentos e o contato com o mundo externo.  Da mesma forma, Rosa Vermelha gostava de correr livre pelos campos e Branca de Neve preferia ficar em casa com sua mãe.

Mas é de grande importância ressaltarmos que não há atitude melhor ou pior, é uma característica, não são escolhas pessoais e sim inconscientes  e instintivas. E muitas vezes podemos apresentar uma atitude introvertida em determinada situação, mesmo sendo uma pessoa extrovertida, pois dentro do inconsciente do extrovertido existe um potencial introvertido que pode ser desenvolvido e vice-versa. Assim, uma pessoa  extrovertida pode dedicar-se a atividades solitárias como artesanato, leitura ou pintura, como uma pessoa introvertida pode ser um professor ou palestrante, que fala para muitas pessoas ao mesmo tempo.


Colocar um pouco da atitude oposta em vossas vidas é possível, é até bastante saudável, muitas vezes bem natural. Mas, quando há um desejo ou necessidade de mudança maior, o processo torna-se mais delicado. Nossa consciência teme o desconhecido, e esse esforço pode ser bastante desgastante psicologicamente.  Assim, essa busca por conhecer e desenvolver seu potencial oposto deve acontecer sempre respeitando seus limites e de preferência dentro de um processo de psicoterapia.



Para entender melhor...

Jung - Carl Gustav Jung é o psiquiatra suíço que desenvolveu a psicologia analítica, em 1921 apresentou os termos extroversão e introversão em sua obra Tipos Psicológicos.

Consciência  - Conforme Stein (2004), a consciência é o estado de conhecimento e entendimento de eventos externos e internos. É o estar desperto e atento, observando e registrando o que acontece no mundo em torno e dentro de cada um de nós.

Inconsciente -  Para Jung (2000), o inconsciente é formado pelos conteúdos que não estão na consciência, sendo eles de origem pessoal, como conteúdos reprimidos ou esquecidos ou de origem coletiva, formada por conteúdos e comportamentos universais. O inconsciente relaciona-se com a consciência de maneira funcional, enviando à ela informações que são importantes para o seu desenvolvimento.


Para saber mais....
JUNG, C. G. Tipos Psicológicos 8. ed. Petrópolis: Vozes, 1991. 


BibliografiaJUNG, C. G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Vozes, 2000. 

STEIN, M. O Mapa da Alma: uma introdução. São Paulo, Cultrix, 2004. 

2.8.16

Será que ele me ama ?

Por Tania Mendonça




Há algum tempo uma amiga durante um papo descontraido me perguntou : você acha que meu marido me ama? Eu respondi perguntando: o que significava o amor para ela, sua resposta foi que amar é gostar, querer estar junto. A definição do dicionário é forte afeição por outra pessoa, nascida de consanguinidade ou de relações sociais, também é definido como atração baseada no desejo sexual.
Continuei perguntando: você sabe o que significa o amor para o seu marido? Você já pensou que o amor e o casamento têm significados, expectativas e realizações diferentes para cada pessoa? Ela me disse que nunca tinha pensado nisso. De fato o amor não segue receitas, o que dá certo para determinado casal é um pesadelo para outros. Meu marido trabalha em casa e nos vemos bastante durante o dia, uma amiga disse que se convivesse tanto assim já estaria separada, que conviver poucas horas por dia é suficiente, mais seria insuportável.
Muitas vezes esquecemos de perguntar para o outro o que ele deseja e acha importante e da mesma forma achamos ou queremos que o nosso parceiro tenha uma bola de cristal e deva adivinhar o que queremos. Não, não, não! Isso não é possível ! Se para duas pessoas a mesma palavra tem significados diferentes, imagina atitudes, manifestações de carinho e amor ou a ausência delas. É preciso perguntar, esclarecer, conversar e expor o que pensa e deseja.
Continuei perguntando para minha amiga: você já pensou que a educação familiar que ele teve construiu a forma como ele vê o amor e se relaciona? Que a constituição familiar difere pelo período histórico e influências sociais? Ela me olhou com uma cara abismada, para não dizer totalmente espantada. Expliquei para ela que a nossa família e depois os amigos formam o nosso repertório comportamental, o que é valorizado em determinada família pode não ser valorizado em outra. São os pais ou cuidadores que nomeiam para a criança os sentimentos e definem as suas consequências, por exemplo: Fulano, você está apaixonado! Que idiota é você??? Só os fracos demonstram sentimentos.
Como será uma pessoa se relacionando tendo esse tipo de educação? Ou então: Fulana, você está sentindo raiva, esse sentimento não é bonito, você não pode sentir isso!!! A forma como as pessoas nomeiam os sentimentos e a forma de lidar com eles surge de uma série de crenças e julgamentos de valor, que interferem muito nos relacionamentos. Tenho uma amiga muito querida que ama dar presentes, mas o que ela mais gosta é de embrulhar com papéis bonitos e fitas coloridas. Ela fala que isso representa cuidado e afeição. Imaginem a frustração dela quando ganhou um presente do namorado sem embrulhar, ela ficou péssima e se perguntou se ele tinha amor ou algum afeto por ela. Hoje ele que é marido, dá presentes bem embalados, mas ela precisou falar o que era importante para ela.
Na nossa conversa que foi muito agradável, refletimos como acontece o relacionamento dos dois, ela falou sobre a educação que ele teve, como a mãe não era carinhosa, não tendo muito diálogo. Conseguimos observar como ele se comporta e quais atitudes poderiam significar e representar que ele a ama, como levá-la no trabalho todos os dias, ajudá-la em algumas tarefas domésticas. Sobre os defeitos nem precisamos rememorar, afinal a dúvida do começo do nosso papo e do presente texto se justifica.
Com o desenrolar da conversa, ela me disse que amor para ela significava cumplicidade, ser carinhoso, atencioso, conversar, ajudar nas tarefas domésticas, ter um objetivo de vida em comum, que amor não podia ser definidado somente por um atributo, mas um conjunto de atitudes e que cada parceiro pode fazer diferente para mudar a relação sem ficar esperando a atitude do outro. Depois de bastante refletirmos, eu disse que acredito que o marido a ama, porém da forma como ele construiu e aprendeu ser o amor, a questão que ficava é se para ela é suficiente o amor que ele tem a oferecer, ela ficou pensativa.
Quando comecei a escrever o blog, ela me sugeriu escrever sobre a nossa conversa, ela me contou que passou a ver o marido de uma maneira mais compreensiva, que começou tentar a olhar as atitudes dele sem o julgamento da visão dela de estar certa ou errada. A sua mudança de observação sobre o relacionamento familiar dele confirmou que ele tem atitudes parecidas com a mãe e com as irmãs. Percebeu que mesmo amando o marido, se não existirem as atitudes que ela acha importante, pode haver uma separação.
Homens e mulheres são muito diferentes, cada pessoa na sua formação como indivíduo tem influências familiares, sociais, culturais e afetivas diversas. Sempre brinco com o meu marido que não entendo como casamento dá certo, ele dá risada. Sou casada há 10 anos e amo-o mais hoje do que quando casei, creio que para nós o que fez dar certo é respeito, diálogo, amizade e muita paciência.
Sempre me lembro das palavras de uma professora do curso de Psicologia que fez todo sentido para mim por se parecer com a forma como significo o amor: " o namorado dela disse que amava e pensava muito nela, ela respondeu : eu não me relaciono com o que você sente, eu me relaciono com o que você faz."

Aplausos para ela!

21.7.16

A Menininha dos Fósforos


Por Tania Miranda

Os contos de fadas fazem parte de nossas vidas, de nossas lembranças, e na maioria das vezes são escritos e lidos para encantar e divertir as crianças. Mas por meio deles também conseguimos observar as mais variadas manifestações do inconsciente,  cada conto nos mostrando possibilidades de compreensão e desenvolvimento de nossos potenciais.

Nos processos de psicoterapia utilizamos as imagens dos contos para representar situações reais,  com as quais as pessoas podem se identificar, refletir e encontrar novas soluções.

O conto " A menininha dos fósforos", nos traz a historia de uma menina que não tinha nem pai, nem mãe, e morava na floresta negra. Ela perambulava pelas ruas frias sem sapatos, apenas com o fino casaco que possuía. Era vendedora de fósforos, e naquela noite implorava a desconhecidos que os comprassem. Mas ninguém comprava ou reparava nela. 

Cansada e com frio, resolveu se sentar na neve e usar os fósforos para se aquecer. Ascendeu o primeiro e o frio pareceu desaparecer. Se viu diante de um fogão maravilhoso,  ela se sentou junto a ele e se sentiu no paraíso. Mas logo a chama se apagou e ela estava mais uma vez na neve. Ascendeu o segundo e um delicioso ganso assado veio em sua direção, mas tudo desapareceu quando a luz do fósforo se apagou.   Acendeu o terceiro fósforo e viu uma linda árvore de Natal cheia de velas, que foram subindo para virar estrelas no céu. Uma delas, transformou-se em estrela cadente, e ela se lembrou de sua mãe ter lhe dito que quando morre uma alma, uma estrela cai.

E do nada surgiu a avó que ela tanto amava, e que delicadamente a tomou nos braços e a envolveu com seu avental. Mas a avó também começou a desaparecer e a menina passou a acender cada vez mais fósforos para mantê-la consigo, até que elas começaram a subir juntas para o céu, onde não havia frio ou fome.  E pela manhã, entre as casas,  encontraram a menina imóvel e morta. 

Esse conto nos mostra a distância que podemos estar de nós mesmos, presos a um frio de carinho. Quantas vezes cada um de nós nos sentimos assim, abandonados , acendendo fósforos para conseguir atenção e afeto, vendo nossas forças se perderem em meio às fantasias de grandes amores e  grandes conquistas sem real sentido, morrendo um pouquinho a cada vez que voltamos à realidade. Essas fantasias nos paralisam, nos impedem de agir, sempre com a sensação de que nada mais pode ser feito.

Como nos vícios, nos vemos em busca do curto, mas imediato prazer, que nos leva ao consumo sem limites, á relações sexuais sem sentido verdadeiro, ao abuso de substâncias químicas, enfim, a acender fósforos e os ver apagar.

O símbolo do fogo nos remete à vida, à paixão, ao conhecimento intuitivo e os fósforos na história são pequenas chamas que carregamos conosco,  são nossos sonhos, nossos potenciais e nossa criatividade.

Somente quando estamos próximos de quem realmente somos e sabemos com clareza o que desejamos, podemos agir, passar a acender fogueiras e a alimenta-las com nossa criatividade e intuição.

Na história a menina vê em sua fantasia a estrela cadente, que acredita ser o aviso de uma morte. Mas a estrela cadente também simboliza iluminação, sorte, e nas culturas mais antigas, um presente dos deuses que veio do céu.  

Nosso presente é a capacidade da psique humana de renascer, de poder reconstruir-se. Antecedendo a morte da menina, surge um raio de luz, a esperança de poder retornar à vida quando conseguimos nos aproximar de quem somos.  Mas vale lembrar que esse retorno pode ser bastante longo e doloroso, por isso é melhor que estejamos atentos a nós mesmos e a nossos reais desejos.

18.7.16

Você é bem sucedido ?


Por Tania Mendonça

Atualmente ouvimos muito na mídia que determinada pessoa é bem sucedida, prestamos atenção para saber por qual motivo isso é reconhecido, em geral a pessoa em questão tem bastante dinheiro, é muito bonita(o), faz uma atividade muito diferente e excitante ou é famoso.

Ser bem sucedido seria ter muito dinheiro, viver ostentando e esbanjando, deixando evidente o quanto foi agraciado pelo sucesso. Fico me perguntando se todas as pessoas devem ter dinheiro como prova de terem dado certo. Será que um feirante que acorda de madrugada não pode ser bem sucedido ? Será que uma manicure que goste do seu ofício não tem sucesso?

Outra forma de ser reconhecido é ser muito bonito(a), se Deus concedeu a beleza naturalmente, que alegria!!! Mas, se não foi condecorado ainda é possível com dinheiro se tornar uma pessoa bonita, com ajuda de cirurgias e belas roupas. Me preocupa a valorização exacerbada da beleza em detrimento de outras qualidades.

Claro todos gostaríamos de ser bonitos, eu também! Risos. Porém, a padronização e idealização da beleza leva os pobres mortais a se sentirem mal e desprovidos de algo fundamental, cabe também comentar que diferenças culturais e de etnia não são consideradas quando o ser belíssimo e dentro dos padrões em questão é alvo de aplausos.

Não ser vaidosa, não ter muitos sapatos e frequentar a cabeleireira semanalmente é pecado mortal, será que uma dona de casa e mãe descabelada, com as unhas por fazer não pode ser bem sucedida ?

Outra característica de sucesso é ter uma atividade profissional diferente ou excitante, quanto mais diferente melhor, é sinônimo de sucesso garantido. Outra reflexão: será que o grande número de professoras que trabalham diariamente não é bem sucedida? Será que um profissional que conquista uma posição na sua carreira não é sucesso? Quem executa suas atividade rotineiramente não tem valor?

A fama por qualquer motivo que seja congratula o indivíduo, muitas vezes o reconhecimento público é passageiro e outra pessoa será exposta como a bola da vez. O dinheiro, a beleza ou atividade diferente ou excitante trazem a fama, mas não é garantia de mantê-la. Quantas pessoas tratam mal e desprezam as empregadas domésticas, dizem que querem ganhar bem sem ter estudo, juro que já ouvi isso literalmente, mas não fariam o trabalho delas. Quem foi limpar a casa, fez um serviço impecável e não ficou cansada que atire a primeira pedra. Cuidar de uma casa não é fácil, as donas de casa também são estigmatizadas quando falam que não fazerem nada o dia todo. Nem vou expor ou comentar o palavrão que pensei. Risos.

Afinal, o que é ser bem sucedido? Depois de muito refletir, cheguei a conclusão que o referencial para perceber o sucesso deve ser comparar as realizações conquistadas aos sonhos, objetivos e projetos da própria pessoa, sendo comparada a sí mesma. Quantas pessoas não são bonitas, ricas, fazem uma atividade profissional diferente ou tem fama e são felizes? Para o sonhador, a realização é o sucesso. Para a mãe que se dedicou a cuidar dos filhos sucesso é vê-los bem. Podemos considerar que se o objetivo do indivíduo são as maneiras de sucesso comentadas aqui, ele também será bem sucedido.

O reconhecimento público pode ser muito agradável e importante, porém existem formas de felicidade que são muito pessoais e devem ser respeitadas. Creio que se fosse escolhido esse parâmetro de comparação a sí mesmo para perceber o sucesso, um número maior de pessoas seriam reconhecidas como bem sucedidas.

Essa cobrança social das pessoas serem valorizadas e reconhecidas por qualidades externas, enquanto outras características são olvidadas, descaracteriza o indivíduo como único e despreza a possibilidade fantástica que aceitar e respeitar as diferenças e favorecer o desenvolvimento dos potenciais de cada pessoa. Socialmente considera-se as pessoas sendo todas iguais e despreza-se que cada uma é única e singular. É uma bonita visão pensar em um mar com as gotas diferentes.



15.7.16

O caleidoscópio e a Fenomenologia


Por Tania Mendonça

     Tenho uma memória afetiva muito agradável de um caleidoscópio, minha amada avó me presentou, lembro que me fascinava as cores e formas sempre diferentes, até hoje me encanta a mudança constante de formas e guardo o meu presente de infância com muito carinho. Há pouco tempo encontrei na internet um vendedor de caleidoscópios e comprei para presentear as crianças queridas.

        No Dicionário Informal da Lingua Portuguesa acessado pela internet o significado da palavra é o seguinte: Pequeno tubo óptico formado por um cilindro cujo fundo está repleto de pedaços coloridos de vidro, sendo estes refletidos por espelhos colocados no seu interior, ocasionando, por meio da sua movimentação, imagens coloridas e diferentes. 

       Como criança o objeto parecia ser mágico, hoje consigo pensar que a incidência de luz dentro do objeto possibilita enxergarmos a mudança de formas, sei que não é mágica, mas continuo sentindo como se fosse .

       Outra paixão na minha vida é a Psicologia, foi a segunda faculdade que conclui, a primeira foi Pedagogia, sempre observei como surpreendente que por meio da escuta e da fala do paciente podemos ajudar e aliviar sofrimentos, construir auto conhecimento.

       No magistério, o comportamento de uma grande amiga me intrigava, quando ela chegava e ia embora somente cumprimentava a mim com beijo no rosto. Depois de algum tempo percebi que eu era a única que a cumprimentava assim, como fazia com outras amigas, portanto comigo ela era diferente, porque o meu comportamento mudou a atitude dela. Foi uma bonita percepção que se formou, comecei a me interessar por Psicologia.

        Quando comecei a conhecer as linhas teóricas tive uma grata surpresa, conheci a Fenomenologia e seus conceitos filosóficos, descortinei uma nova possibilidade de compreensão das pessoas, um olhar diferente de tudo que eu já havia visto e lido. Aprendi que seu início foi no século XX com a obra de Edmund Hursserl, sendo uma maneira nova de fazer Filosofia dando ênfase à experiência vivida, ao fenômeno, tal qual aparece, se manifesta ou se revela por si mesmo. 

        Existia uma crise das ciências, havia uma tensão entre posturas opostas: a proposta positivista de transpor os métodos das ciências naturais para se estudar o homem e a proposta fenomenológica de que o homem tem características que solicitam um método de estudo diferente, sem pautar-se nos métodos das ciências naturais.

       A princípio tudo me pareceu confuso, mas com o desenrolar das aulas começou a fazer sentido, afinal o homem tem peculiaridades que diferem muito dos objetos das ciências naturais, fez sentido que deveria ser estudado de maneira diferente, buscando um sentido, um significado e não apenas uma explicação. 

      Esse novo método filosófico procurou não estar impregnado por pressuposições científicas ou culturais, como o senso comum ou o uso de qualquer crença ou julgamento. Seu objetivo seria explorar os fenômenos como aparecem à consciência, descrevendo-os e deixando de lado as explicações causais. 

     Essa compreensão se mostrou totalmente nova, fiquei entusiasmada! Aprendi que o método fenomenológico, significa uma atitude, uma maneira de olhar as coisas. Dá-se sem pressupostos, focando-se na essência do fenômeno, um modo descritivo que busca a interpretação dos sentidos dos fenômenos. 

        A Fenomenologia no sentido etimológico significa trazer a luz, mostrar, manifestar e fenômeno é o que se mostra a luz. Você pode estar se perguntando como a Fenomenologia se relaciona com e caleidoscópio. A psicologia é uma grande paixão, podemos olhar o mundo de maneira nova, a luz no caleidoscópio permite-nos ver inúmeras figuras, a compreensão fenomenológica possibilita trazer à luz o fenômeno que estava as sombras.

       O fascinio pelo brinquedo continua, a postura fenomenológica acrescentou muito a minha visão de mundo e prática profissional. Vamos olhar por esse caleidoscópio que é a psicologia e com o seu movimento revelar novos conhecimentos, fazer reflexões e perceber figuras coloridas, novas e reveladoras. A luz da percepção do que estava oculto pode ser libertadora.

      Dedico esse texto a minha psicóloga que caminha comigo de maneira cuidadosa e carinhosa pelos caminhos tortuosos e cheios de possibilidades da terapia. Ela é uma excelente presença.


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